Neste artigo, vou falar sobre empreender na terceira idade, um tema cada vez mais relevante, especialmente no Brasil, onde a população idosa tem crescido de forma significativa. De acordo com o IBGE, em 2010, o Brasil contava com cerca de 19 milhões de pessoas com 60 anos ou mais. Agora, em 2023, esse número já ultrapassa os 37 milhões, e a tendência é continuar crescendo. Estima-se que, até 2050, 1 em cada 3 brasileiros será idoso.
Esses números mostram que o Brasil está envelhecendo rapidamente. Muitas pessoas encaram a chegada aos 60 ou 65 anos como o momento ideal para relaxar e aproveitar a vida. Porém, outros não querem ou não podem abrir mão de continuar atuando profissionalmente. Muitos chegam à terceira idade com saúde, energia e disposição para continuar trabalhando. Infelizmente, ainda são poucas as empresas que reconhecem o valor e a contribuição que as pessoas mais velhas podem oferecer.
Contexto histórico
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo experimentou um período de grande euforia. Isso resultou em um fenômeno chamado “baby boom” — uma explosão nas taxas de natalidade entre 1946 e 1964. Eu, inclusive, faço parte dessa geração, os chamados “baby boomers”.
Esse boom populacional veio acompanhado de grandes mudanças. Avanços em saúde, alimentação e medicina transformaram o padrão de vida. A expectativa de vida dos baby boomers, que antes era inferior a 50 anos, aumentou em cerca de 30 anos. Ou seja, ganhamos mais tempo de vida e, o melhor, com saúde e disposição para continuar ativos.
A nova realidade da aposentadoria
Para muitos boomers, a imagem tradicional da aposentadoria tranquila, sentados em uma cadeira de balanço ou pescando em dias de sol, já não é mais a realidade. Diante de um mercado de trabalho restrito para profissionais mais velhos, empreender surge como uma possibilidade atraente, especialmente para aqueles que não estão satisfeitos em “pendurar as chuteiras”. No entanto, é crucial entender que, embora empolgante, empreender na terceira idade traz consigo desafios que não podem ser ignorados.
Os desafios de empreender na terceira idade
Abrir um negócio aos 60 ou 70 anos pode parecer uma excelente ideia. Afinal, trazemos conosco uma vasta bagagem de conhecimento, conexões e, em muitos casos, algumas reservas financeiras. Tudo isso pode nos fazer acreditar que é a receita perfeita para o sucesso. Contudo, é preciso ter cautela.
Muitos empreendedores caem na armadilha que os economistas Giovanni Dosi e Dan Lovallo chamam de “mártires do otimismo”. Isso significa que o otimismo exagerado pode levar ao fracasso, muitas vezes beneficiando competidores mais aptos. No início da carreira, os fracassos são frequentemente encarados como oportunidades de aprendizado. Porém, na terceira idade, os custos de um erro são muito maiores, e as chances de recomeçar são menores.
O equilíbrio entre otimismo e cautela
Então, será que o pessimismo é o melhor caminho? Claro que não! O segredo está em equilibrar otimismo com cautela. Para os mais jovens, apostar todas as fichas no primeiro empreendimento pode não ser tão arriscado, já que o impacto financeiro de um fracasso é menor. Quando quebramos jovens, podemos utilizar as lições que aprendemos para voltar a empreender com mais conhecimento e maturidade. Mas, para o empreendedor da terceira idade, a situação é diferente.
Um aspecto crucial que muitos ignoram no Brasil é a falta de entendimento sobre o conceito de empresa de responsabilidade limitada. A justiça brasileira, em muitos casos, responsabiliza o patrimônio pessoal do empreendedor em caso de falência. Isso pode trazer grandes dificuldades para a família, especialmente quando as reservas financeiras estão em jogo.
A importância do planejamento e da orientação
Antes de se aventurar no empreendedorismo na terceira idade, é essencial buscar a orientação de profissionais, como advogados e planejadores financeiros. O risco de comprometer todas as suas reservas em um eventual fracasso não deve ser subestimado. Montar boas estruturas de blindagem patrimonial, com planos de previdência e seguros, pode ajudar a controlar o risco. Empreender pode ser uma jornada incrível, mas deve ser trilhada com os pés no chão.
A força empreendedora da terceira idade é um ativo valioso para a sociedade, mas é preciso ter cuidado para que essa energia não se transforme em grandes perdas financeiras, em um momento em que os recursos financeiros são fundamentais. Antes de tomar qualquer decisão, busque orientação, reflita e planeje. Empreender na terceira idade pode ser uma aventura gratificante, desde que os riscos sejam adequadamente geridos.
Jurandir Sell Macedo
Doutor em Finanças Comportamentais com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva, sendo pioneiro nesta área no Brasil. Nosso consultor na área financeira e previdenciária.