Quando a Elos me convidou para escrever um artigo sobre o Dia das Crianças, a primeira ideia que tive foi de convidar para participar a Celina, minha companheira na educação da Júlia e do Gustavo, nossos filhos. Além de mãe dedicada, Celina foi professora do ensino fundamental e médio na UFSC por 30 anos e é autora do livro “Filhos, seu melhor investimento: criando filhos independentes financeiramente”, da Editora Alta Books.
Eu e Jurandir nos conhecemos ainda na adolescência e tivemos uma vida bastante diferente. Fui criada em uma família com muitos recursos, enquanto ele perdeu o pai ainda criança e teve uma vida com dificuldades financeiras. Eu era um típico peixinho de aquário, acostumada a proteção, e o Jurandir era um peixe de rio, acostumado a um ambiente um tanto desafiador.
Quando tivemos nossos filhos, logo ficou claro que não queríamos nenhum desses modelos de criação. Queríamos proteger nossos filhos, mas, queríamos que eles tivessem garra. Felizmente, acreditamos que tivemos sucesso na prazerosa e árdua empreitada. Hoje a Júlia e Gustavo são independentes, responsáveis e empresários de sucesso e trouxeram para nossa família os queridos Marcos e Maria Cícera.
Partindo da ideia de que alcançamos sucesso na tarefa de educar nossos filhos, sentimo-nos inspirados a compartilhar o que aprendemos ao longo desse caminho. Neste artigo, iremos abordar alguns aspectos envolvidos na educação financeira dos filhos.
Não achamos que nossas experiencias sirvam como um guia absoluto, pois a educação dos filhos é uma tarefa tão complexa e tão dinâmica que não pode ser reduzida a uma fórmula. Grande parte do que aprendemos com educação da Júlia precisou ser adaptado para o Gustavo. Pois, entendemos que os filhos são como diamantes brutos, só podemos lapidar com sucesso se aprendermos a respeitar as características singulares de cada gema.
Abordando o assunto com naturalidade
Vamos lá, a primeira lição que gostaríamos de compartilhar é que devemos, sim, falar sobre dinheiro em família, pois esse assunto influencia o futuro de todos. Decidir juntos onde e como usar o dinheiro da casa é uma oportunidade para que todos falem dos seus planos e desejos. Ajuda também a perceber que gastar não é só uma questão de vontade, mas de possibilidades e de escolhas. É uma lição que os filhos levam para a vida inteira.
Quando Julia e Gustavo eram crianças, sempre ganhavam presentes no Dia das Crianças. Nós gostávamos de ver o sorriso deles quando recebiam os presentes. O desejo de agradar os filhos é um dos mais legítimos anseios que um ser humano pode ter. Porém, pensávamos muito bem antes de cair no furor consumista que toma conta de muitos pais, que buscam o presente dos sonhos para seus filhos no Dia das Crianças. Afinal, pais que verdadeiramente educam seus filhos mostram a eles que existem muitos limites na vida.
Aprendendo a lidar com a frustração
Para ensinar nossos filhos que nem sempre eles iriam ganhar o que pediam, foi preciso renunciar à ideia de que os pais não devem frustrar os filhos. Desde cedo explicávamos claramente quais eram os limites de gastos previstos para aquela data especial. Quando os pais não ensinam os filhos a lidarem com a frustração, a sociedade um dia mostrará a eles, mas de forma muito mais cruel. Afinal de contas, será que existe no mundo algum adulto que não tenha que conviver com inúmeras frustrações em seu dia a dia?
Diferente de frustrar é traumatizar. A frustração cria uma barreira que desafia para superação. Um trauma inferioriza e intimida diante de um desafio. Nunca diga a seu filho que ele nunca conseguirá atingir um sonho. Melhor é mostrar que há obstáculos no caminho, mas que com garra e alvo ele pode chegar à realização desse ideal.
Estabelecendo responsabilidades
Quando Gustavo quis ganhar uma prancha de surfe, quando tinha 9 anos, definimos em conjunto como ele podia ajudar a reduzir gastos da casa e foi decidido que seria cuidando da conta de luz. Gustavo tornou-se o vigia da energia, não podia ter nenhuma lâmpada acesa que ele ia logo desligando.
Já a Júlia, quando quis ir para a Disney, ficou responsável por economizar na conta de telefone; anos atrás ter um telefone custava muito e, também, sugeríamos que ela economizasse na mesada para atingir essa meta. Evidentemente que a Júlia contribuiu com uma pequena parte, mas o desafio e o comprometimento foram grandes.
Muitos pais que sofreram restrições financeiras na infância e que conseguiram ascender financeiramente depois de muito esforço, acreditam que devem dar aos pequenos tudo o que não tiveram quando eram crianças. Dar tudo que os filhos pedem tira o prazer da conquista. Aproveite os desejos dos seus filhos para fazer deles adultos responsáveis e batalhadores.
Aplicando as dicas no dia a dia
Vamos para a prática: em casa, da mesma forma que falávamos sobre o que eles estavam aprendendo na escola e sobre os amigos, falávamos sobre mesada, orçamento, planejamentos e trabalho. Lembre-se de que dar bons exemplos é crucial.
Independentemente de quão exaustivo e desafiador tenha sido o dia, chegar em casa e compartilhar aspectos interessantes do seu trabalho é essencial. Alguns pais apenas se queixam do trabalho, e depois ficam surpresos quando os filhos não estão motivados para trabalhar.
Para o Dia das Crianças, converse com os filhos sobre os preços dos brinquedos. É uma excelente oportunidade para ensiná-los sobre finanças, responsabilidade, valor do dinheiro e trabalho. Aqui estão algumas dicas sobre como abordar esse tema de forma adequada:
- Escolha um momento que todos possam conversar;
- Explique, de maneira simples, o conceito de preço e a sua relação com o dinheiro e as coisas.; Envolva os filhos nas escolhas conscientes de compra. Por exemplo, você pode comparar o preço de um brinquedo com o custo de outras coisas, como uma ida ao cinema ou seu lanche favorito;
- Discuta a diferença entre desejar e querer. Explique que, muitas vezes, precisamos fazer escolhas sobre como gastar nosso dinheiro. Não devemos ter tudo o que desejamos. Devemos ensinar aos nossos filhos que precisamos fazer escolhas conscientes e frustrar alguns dos nossos desejos. Se uma criança não é treinada a se frustrar, a esperar, a ceder e a negociar estará fadada a enfrentar muitos problemas financeiros no futuro;
- Estimule a prática de economizar para alcançar um objetivo. Isso pode ensinar a importância da paciência e do planejamento;
- Fale sobre de onde vem o dinheiro para comprar os brinquedos. Introduza conceitos básicos sobre orçamento e economia, explicando que é importante planejar e economizar para comprar coisas que queremos;
- Dê mesada para ao seu filho, pois é um instrumento poderosos de educação financeira. No entanto, é fundamental que a mesada não esteja ligada ao desempenho escolar ou às tarefas domésticas. Na verdade, a mesada deve ser estabelecida a partir de uma conversa, na qual os pais e os filhos discutem quais despesas o filho passará a assumir, e o valor deve ser ajustado de acordo com a possibilidade dos pais. Dessa forma, a quantia não fica sujeita à vontade do filho. A decisão dos pais de conceder semanalmente, a cada quinze dias ou mensalmente depende da idade e da maturidade da criança.
Para finalizar, no Dia das Crianças, o melhor presente mesmo é estar presente. Procure fazer um programa de qualidade com sua família. Que tal um piquenique no parque? Ou reunir os pequenos para descobrir o prazer de cozinhar? Que tal falar sobre mesada? Coloque sua cabeça para funcionar, com certeza existem inúmeras alternativas perto de você que, além de custar muito pouco dinheiro, podem render muitas alegrias para seus filhos.
Feliz Dia das Crianças!
Jurandir Sell Macedo
Doutor em Finanças Comportamentais com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva, sendo pioneiro nesta área no Brasil. Nosso consultor na área financeira e previdenciária.